quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

A Favela e a Corrupção Policial

       A policia carioca fez outra incursão numa grande favela da cidade. O chefão da área desta vez não impôs resistência, e se escafedeu -  pernas pra que te quero! - deixando os comparsas abandonados à própria sorte. Armas e drogas apreendidas, além da descoberta de meia tonelada de produtos contrabandeados do Paraguai, assinalaram o êxito daquela operação.  
       Mas como nesta vida nem tudo é perfeito, e em toda a regra há exceção, a exceção ali também se fez presente sob a figura suspeita de um policial militar. Um brutamontes de meter medo. E dito e feito.
   - Mãos ao alto!... Aqui é a policia... Identifique-se.
   - Pois não, doutor... eu... eu sou morador...  estou apenas descendo pra trabalhar.
   - Qual é o teu nome? Vamos, diga!
   -  Augusto César, mais conhecido como o “imperador do pedaço”.
   - Como? Augusto o quê?
   - Augusto César, doutor... e a seu inteiro dispor... - repetiu o morador, um mulato de boa pinta, abrindo um sorrisinho de piranha.
   - Deixe de besteira, malandro,  e me passe a identidade!
       E como temesse o pior, o mulato abriu a carteira que trazia na mão e sacou o documento de identidade, mas o fez com tanta desatenção que quase deixou cair as duas únicas notas de vinte reais.
   - Aqui está.
   - Vamos ver!... Ok! O nome confere,  pode guardar.                                                
   - Agora posso ir?
   - Calma aí, neguinho!.... Só te libero se você me der um “mônei”.
   -  Não entendi.
   -  Não se faça de bobo:  eu quero dinheiro, MÔ-NEI, e sei que você tem...            
   -  Tá bom, chefia, eu confesso que tenho...Mas são só vinte reais.
   -  Passe pra cá!...
     Reagir?  Numa situação dessas, quem pensaria em reagir? Pior: quem lá na cidade acreditaria na  versão barata de um pobre morador de favela? Porém o morador armou-se de coragem e reagiu. Não botou a boca no mundo, é verdade, mas com um olhar súplice experimentou apelar para o coração filial do brutamontes. E não é que deu certo?
   - Por favor,  não faz isso comigo não! O senhor com certeza tem mãe ou já teve um dia, e sabe como é duro não atender a um pedido de uma mãe sofredora. Com esse dinheiro eu ia comprar um arranjo de flores pra enfeitar o caixão de meu pai, que morreu ontem. Entendeu o meu drama, chefia? Se o senhor tem coração, aposto que  vai entender...
   Por mais que a gente duvide às vezes da generosidade alheia, o policial provou deveras que tinha coração, solidarizando-se:
   - Quantos anos tinha o teu pai?
   - 80 anos.
   - E de que ele morreu, posso saber?
   - Sei lá, doutor. Ele estava sentado na varada de casa, e  de repente deu um troço nele, e pá! caiu mortinho no chão!
   -  Ah... Meus pêsames!... Mas me diz uma coisa: quanto acha que custa um arranjo de flores?
   - Uns vinte reais, por aí...
   Nisso o policial coçou de leva a cabeça; e afundando  a mão no bolso da farda, retirou de lá as duas notas de vinte.
   - Toma aqui esse dinheiro... isso deve servir... Mas é emprestado, ouviu?
   - Ahn...
   - E por favor, não conte nada a ninguém!... Bico fechado, amigo. É que eu não gosto muito de publicidade, contar vantagens, essas coisas...
   - Ok! Entendi. Obrigado... tchau!...
   - Tchau... Mas amanhã eu volto pra acertamos as contas!

 

1 comentários:

Anônimo disse...

gostei muito dessa cronica. isso acontece muito em favelas do Rio.

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